Artigo: ATENÇÃO!!! – A importância da Educação Infantil no desenvolvimento da atenção, parte 1

Escrito por Dâmaris Simon Camelo Borges

PARTE 1

Olá,  pessoal!

Vocês já ouviram alguma coisa referente à importância do desenvolvimento da atenção na educação infantil? Tenho certeza que não, com raras exceções. E justo a atenção, que hoje em dia é tão cobrada por conta da dispersão das crianças e cuja ausência tem levado tantas crianças e jovens à medicalização. Parece uma epidemia! Pais e professores em um coro a respeito da dificuldade da criança de concentrar e fazer as lições, de concentrar e estudar. Já ouvi absurdos de mães desesperadas por seus filhos de 3 para 4 anos terem sido taxados de hiperativos!

Não vamos entrar no mérito da questão da existência ou não de crianças hiperativas e com déficit de atenção, mas, que é evidente que a imensa maioria das crianças assim rotuladas não possuem o distúrbio referido, isso é fato! A não ser que os médicos admitam que existem estudos que comprovam que as crianças estão nascendo com distúrbios e que esses índices de crianças com Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade estão em níveis epidêmicos.

Apesar da formação dos professores não ser mais baseada no senso comum, ainda hoje, aspectos importantes do desenvolvimento são negligenciados e, a atenção é um deles. Vamos entender nesse artigo como uma criança chega a se tornar um adulto capaz de concentrar a atenção naquilo que for necessário. Nessa primeira parte, abordaremos a questão do desenvolvimento da atenção de 0 a 3 anos e na segunda parte, na próxima edição do Blog, o desenvolvimento da atenção a partir dos 3 anos, até chegar na capacidade plena da atenção voluntária

Mas, vamos aos fatos: A atenção não brota do nada, tem que ser desenvolvida. E como se faz isso? Tem o que fazer? Quem tem que fazer? Pais? Professores? Na educação infantil as crianças não têm que brincar? Vamos ter que dar atividades que prendam a atenção dos pequeninos? Muita gente deve estar pensando: “Tadinhos! Tão pequenos e já vão ter que concentrar!” Calma! O processo é muito diferente do que se imagina.

Assim como a memória, a imaginação, o pensamento e a linguagem, a atenção voluntária faz parte das funções mentais relacionadas ao comportamento consciente do homem e que Vygotsky chamava de funções psicológicas superiores. E não! Não é porque são características do desenvolvimento humano que elas vão “surgir” e/ou “amadurecer” à medida que a criança cresce, esse processo depende da situação social de desenvolvimento da criança, de como as pessoas se relacionam com o bebê, dos vínculos afetivos, dos objetos, situações, comportamentos que as pessoas que cercam esse bebê valorizam, das oportunidades de interação com que esses mesmos adultos permitem ao bebê.                

Inicialmente a atenção é baseada em mecanismos inatos e, gradualmente, vão sendo submetidas a processos de controle voluntário. Em outras palavras, o bebê humano nasce com mecanismos de atenção involuntária e vai prestar atenção a estímulos muito intensos, como por exemplo, mudanças bruscas no ambiente e barulhos muito altos. Em todos os ambientes e em qualquer idade, somos inundados com uma infinidade de estímulos que excedem a nossa capacidade de absorvê-los e aos poucos, o bebê passa a ser capaz de escolher os estímulos que vai prestar atenção. Faça o teste: tente se lembrar de todos os detalhes do último ambiente que você esteve antes de se sentar para ler esse artigo e, depois volte lá e anote tudo o que você não se lembrou. Essa seleção é necessária para a adaptação e sobrevivência da pessoa no mundo. E como os objetos ganham relevância e, consequentemente a atenção das crianças? Basicamente, a atenção voluntária do bebê está relacionada com a importância que o objeto tem na vida desse bebê e, aos olhos dos adultos cuidadores a quem ele tem apego. O desenvolvimento da atenção voluntária, não inibe a atenção involuntária, então, um ruído forte, vai continuar chamando a atenção, um movimento brusco, vai continuar a atrair a atenção, independente de uma pessoa ter desenvolvido a capacidade da atenção voluntária ou não.

Assim, entendemos que se o meio onde a criança se desenvolve for favorável, temos um percurso que levará o bebê da atenção instintiva, como por exemplo, voltada ao ouvir a voz da mãe, até uma firme capacidade de concentração que despreza, mesmo estímulos altamente interessantes.

E o que a educação infantil tem a ver com isso? Tudo! Se nós dissemos enfaticamente que todo processo de desenvolvimento e, entre eles o processo de desenvolvimento da atenção, estão vinculados com o meio onde a criança se desenvolve, o adulto que estiver interagindo com elas, precisa se inteirar de como essas fases de desenvolvimento se processam para que ele possa ser um facilitador na vida dessa criança.

Vamos entender um pouquinho como são essas fases:

– De zero até dois ou três anos, a criança parte de um funcionamento involuntário, respondendo aos estímulos do meio e a uma comunicação emocional direta com o adulto cuidador surgida diante de necessidades objetivas do bebê e/ou da ação de alguma outra pessoa que conversa com a criança como se ela pudesse compreendê-lo, atraindo-a para a comunicação; à partir do 3º mês de vida, o bebê começa a diferenciar a presença da pessoa adulta, comunicando-se através de mímicas e sons vocais, atraindo ativamente o adulto para a comunicação; o interesse é direcionado, à partir daí, não mais diretamente ao adulto, mas, aos objetos que ele manipula; a atenção voluntária é compartilhada entre o adulto e a criança; a possibilidade de manuseio e da demonstração de interesse por parte dos adultos é que ampliará o círculo de objetos de interesse da criança; a atenção é inconstante, se surgirem objetos mais chamativos, a atenção da criança se voltará para eles.

Dessa maneira, muito provavelmente com o tempo, se o adulto mantiver o hábito de ler perto da criança, a criança vai gostar de ler, se o adulto não sai do futebol ou do celular, a criança vai voltar a sua atenção para o futebol e o celular. É comum os adultos relatarem que não conseguem fazer mais nada perto da criança porque ela quer fazer junto. É isso! Está tudo certo dentro do processo de desenvolvimento.

Dessa forma, chegamos, provavelmente, nos primeiros estágios de desenvolvimento da atenção voluntária do 1º para o 2º ano até o 3º ano de vida, quando diminui a comunicação emocional direta e, com o desenvolvimento da capacidade de se locomover, surge o impulso de explorar o meio; a atenção passa a ser direcionada aos objetos que ele vê e interessa-se por suas características, especialmente quando eles podem ser alcançados, assim, se ela pega um telefone nas mãos, ela está interessada pela forma desse telefone, cor, peso, resistência e aos poucos vai direcionando sua atenção para outro aspecto; começam a entender que os objetos estão inseridos dentro de um contexto com um sentido social e todo esse processo é acompanhado do desenvolvimento da linguagem, ou seja, começa a se interessar pela utilidade do telefone.

Assim, essa fase se resume naquela criança que se interessa vivamente por correr explorando suas possibilidades de movimentação, subindo e descendo de prateleiras, mesas, cadeiras e explorando suas possibilidades de comunicação; procura intensamente conhecer o mundo ao seu redor, principalmente os objetos que são manipulados por adultos a quem ela aprecie; objetos complicados, menos atrativos, principalmente se forem completamente desconhecidos e que não são de interesse dos adultos que ela gosta, não lhes interessam.

Entendendo esse processo, entendemos também o porquê os bebês não se interessam, se agitam, irritam, choram, brigam, quando o adulto joga uma caixa de brinquedos no chão e fica distraído ao telefone, vendo televisão ou mesmo conversando com outra pessoa.

Ter consciência do nosso papel nesse processo, nos induz a ter consciência de que nós temos um roteiro de convivência a cumprir junto de nossas crianças e que não temos como responsabilizar o outro ou assumir um discurso precoce de patologização, mesmo que induzidos por terceiros, para nos isentarmos das ações que nos cabem.

No próximo artigo, conversaremos sobre o processo de desenvolvimento da atenção, à partir dos 3 anos até que esteja sedimentada a capacidade da atenção voluntária.