*Saulo Simon Borges
Morte é o nome que damos às transformações que desconhecemos a outra metade do processo.
Foi no Século XVIII que Antoine Lavoisier formulou a frase “na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma” quando percebeu, a partir de suas observações, que o fogo não representava a destruição da matéria, mas a sua transformação em uma nova forma que nossos sentidos e tecnologias não podiam captar até então. Esta percepção foi impactante às ciências naturais que conseguiram espiar mais um pouco além do véu do misticismo que trazia explicações mágicas aos fenômenos observados pelos seres humanos.
Já no Século XIX, Allan Kardec, codificador da doutrina espírita, explica que a morte do corpo representa a continuidade da vida em outro plano, chamado de plano espiritual. Assim, temos o corpo físico decompondo-se e restituindo à terra seus elementos químicos e, a alma, liberta da matéria, transitando livremente no plano espiritual. Ambos os fenômenos explicados pela máxima de Lavoisier e verificáveis através dos experimentos científicos, no caso daqueles, e das vivências mediúnicas, no caso destes.
Ainda assim, a morte é temida enquanto a vida é celebrada. Na verdade, tememos a metade que desconhecemos: ao cerrarmos os olhos, o que encontraremos?
A vida é cheia de mortes: processos morrem, ideias morrem, sentimentos morrem, relacionamentos morrem. Mas é importante fazermos a leitura correta desta verdade. A vida é cheia de transformações: processos são transformados, ideias são transformadas, sentimentos são transformados, relacionamentos são transformados. Ainda assim, resta a pergunta que nos assombra: transformam em quê?
Enquanto nas ciências naturais as transformações são verdades imutáveis, restando a nós apenas descobrir os resultados dos processos de transformação, nas ciências sociais devemos descobrir os desdobramentos desses fenômenos, mas podemos ir muito mais além. Podemos alterar seus resultados.
Este é ponto fundamental das comunicações mediúnicas e da mensagem espírita: conhecendo a existência e características da vida após a transformação (morte), como podemos ter um resultado de felicidade, bem e paz? As respostas da pergunta acima motivam os debates no movimento espírita e orientam as ações dos indivíduos deste grupo, passando a representar a filosofia de vida e o paradigma ético deles.
Mas, conforme apontado acima, não morremos apenas na morte do corpo físico. Estamos cotidianamente transformando nossas vidas, muitas vezes desconhecendo a segunda parte deste processo.
A morte tem seus inconvenientes, evidentemente. Toda mudança envolve um risco de trocar aquilo que temos dimensionado e conhecido por algo desconhecido e potencialmente negativo. Por isso, também resistimos cotidianamente à morte. Não que seja ruim, é importante que tenhamos o impulso da preservação. Mas a morte natural, não provocada, é inexorável e necessária. Resta-nos conhecê-la e prepararmo-nos.
Sabemos que é inexorável por uma realidade que sentimos desde o surgimento da espécie humana na Terra: as coisas mudam e nada permanece. Hoje sabemos que nem mesmo as estrelas que observamos no céu são imutáveis, mas fazem parte de um Universo em constante transformação. E necessária, pois é com a transformação que os progressos são possíveis. Se as coisas fossem as mesmas sempre, nada teria a possibilidade de melhorar.
É com base nesta introdução que gostaria de contar a vocês a transformação que nós, do Instituto Espírita Paulo de Tarso, atravessaremos no próximo ano e as ações que temos tomado para nos preparar.
Dia 25/01/2025 será o último dia de uma gestão da Instituição que está a sua frente desde 26/01/2021, ou seja, quando completar 04 anos. O processo é inexorável por ser uma importante evolução da nossa sociedade em perceber os benefícios da alternância de poder que assim estabelece para os governantes públicos e nós, do Instituto, reproduzimos em nosso estatuto. E necessário por ser o momento de oxigenar as propostas e ações atualmente existentes, colocando à prova para observarmos quais delas permanecerão com os necessários ajustes e quais sucumbirão para dar espaço às novas propostas e ações.
O resultado que gostaríamos para esse fenômeno da troca de gestão do Instituto é a atualização de suas práticas, ampliação de suas ações e perenização de sua existência e valores. E, como não poderia ser diferente, temos também nossos diálogos de quais seriam as melhores formas de assim prosseguir e tentamos orientar nossas ações a partir deles. Gostaria de compartilhar uma pequena parte de nossos esforços.
‘Como uma andorinha só não faz verão, de nada adiantaria a existência de apenas um indivíduo com capacidade de criar e gerir processos. Sua ausência, que é inevitável em algum momento, fará com que o grupo se desoriente e, muito provavelmente, se desagregue. Inclusive, é assim que as novas gerações têm pensado as novas formas de colaboração: não como uma cascata de hierarquia, mas como uma rede difusa de comando.’
O primeiro deles é a construção coletiva de um Plano de Ação Institucional. Essa prática foi implementada há alguns anos no Instituto, mas só recentemente tem ganhado capilaridade nos indivíduos que tomam decisões. O alinhamento das estratégias garante que todos do barco estejam remando para o mesmo lado e a metodologia para isso é uma conversa permanente. Não por outro motivo que o acompanhamento deste Plano de Ação Institucional é periódico e coletivo em reuniões que todos apresentam e opinam nos resultados e descobertas feitas ao longo do semestre.
Depois, temos na construção de autonomia dos indivíduos outra forma de preparar para a transformação que se aproxima. O funcionamento orgânico da Instituição necessita na sua composição de indivíduos cientes de suas atribuições, com poderes e recursos para tomar e implementar suas próprias decisões e formas eficientes de responsabilização por elas – tanto para valorizá-los quanto para corrigi-las. Somente deste modo que garantimos a estabilidade dos processos do Instituto e promovemos sua continuidade na transformação que se aproxima.
Por fim, temos a aproximação dos membros e a viabilização de outras pessoas capazes de liderar Instituições. Como uma andorinha só não faz verão, de nada adiantaria a existência de apenas um indivíduo com capacidade de criar e gerir processos. Sua ausência, que é inevitável em algum momento, fará com que o grupo se desoriente e, muito provavelmente, se desagregue. Inclusive, é assim que as novas gerações têm pensado as novas formas de colaboração: não como uma cascata de hierarquia, mas como uma rede difusa de comando. Que, diga-se de passagem, é assim que nosso cérebro funciona através de nossos neurônios.
Temos estado empenhados na transformação que se aproxima. Na verdade, estamos ansiosos para ela. A benéfica mudança é bastante promissora. Não tememos o desconhecido, pois não desconhecemos: temos gestado desde o início deste mandato a próxima gestão que chegará com a missão de novas conquistas.

* Saulo Simon Borges é Diretor do Instituto Espírita Paulo de Tarso com as funções de Presidente, 2021, mestre e graduado pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – USP.